Derivada da Função Exponencial e da Função Logarítmica
Nesta seção, veremos uma das funções mais presentes na modelagem de fenômenos naturais, a função exponencial. Esta função está por trás de qualquer fenômeno em que a taxa de variação de uma grandeza é proporcional ao valor da própria grandeza. É fácil listar fenômenos deste tipo: crescimento populacional, juros e decaimento radioativo. Como você já viu nas semanas 5 e 6, a derivada de uma função em um ponto representa uma taxa de variação instantânea da função, ou uma tendência de crescimento/decrescimento. Assim, como veremos logo abaixo, a derivada de uma função exponencial será sempre proporcional ao valor da função. A partir daí, intuiremos a existência de uma base especial, um número que denotaremos por , que torna a expressão da derivada ainda mais interessante. Depois, estudaremos a função inversa à exponencial nesta base , a função logarítmica em base natural, que chamaremos de .
Parte do conteúdo apresentado aqui é feito também no vídeo que você deve assistir:
A Função Exponencial e sua Derivada
Caso você acredite que precisa rever alguns conceitos mais elementares de funções exponenciais, recomendamos assistir aos vídeos de revisão:
Função Exponencial - Exemplos
Explorando a Função Exponencial
A Função Exponencial
Observação: Se você já possui bastante familiaridade com a função exponencial, ou está querendo chegar logo aos resultados sobre derivação desta função, pode pular direto para a seção A Derivada da Função Exponencial.
Vamos denotar uma grandeza que varia em função do tempo por . A variação da grandeza depende, obviamente, do fenômeno estudado. Porém, em muitos fenômenos naturais, observa-se que, a razão de crescimento é a mesma sempre que se passa um mesmo intervalo de tempo.
Exemplo 1
Imagine uma população de bactérias, inicialmente com 1.000.000 de indivíduos, que dobre a cada 1 hora, enquanto não houver restrição que dificulte este crescimento.
Vamos considerar o tempo do início da observação como . Teremos um crescimento como abaixo:
| 0 | 1 | 2 | 3 | 4 | 5 |
População | 1.000.000 | 2.000.000 | 4.000.000 | 8.000.000 | 16.000.000 | 32.000.000 |
A cada hora, a população será o dobro da anterior. A partir disso, podemos obter uma expressão para a população , quando for um inteiro não-negativo.
Também é razoável imaginar que, 1 hora antes do estudo, ou seja, quando , a população de bactérias era a metade da população em , isto é,
Duas horas antes do início, a população seria 1/4 de , três horas antes (), seria 1/8 de , e assim por diante, para que, depois de dobrar 2 ou 3 vezes, respectivamente, a população se tornasse .
Assim, teríamos
Com isso, para todo , ou seja, inteiro, positivo, 0 ou negativo.
E qual seria o crescimento a cada intervalo de meia hora? Estamos supondo que o crescimento relativo é o mesmo em intervalos iguais de tempo. Assim, o fator de crescimento de para será o mesmo de para , ou seja,
Substituindo o da primeira linha na segunda, temos que
Mas sabemos que , logo
(obviamente desprezamos a possibilidade , pois não faz sentido real no problema).
De maneira geral, a cada intervalo de hora, teremos um mesmo crescimento relativo, logo
mas como , temos , logo . Com isso, a população de bactérias aumenta a cada hora. Portanto, passados períodos de horas, a população terá aumentado vezes e, com isso,
Até aqui, já concluímos que para todo , isto é, para todo que possa ser escrito como uma fração , com e inteiros, .
E se for um número irracional? Qual seria a população de bactérias? É natural acreditarmos que continuaria sendo dada por , porém, o que seria neste caso? Tentaremos responder a esta pergunta somente depois.
Exemplo 2
Imagine que, no exemplo anterior, a população inicial de bactérias é , e a cada hora decorrida, a população é multiplicada por . Neste caso, teríamos
Como no exemplo anterior, poderíamos estender a expressão para qualquer , isto é, qualquer , com e inteiros, . Teríamos que
Lembramos que .
Os fenômenos descritos nos exemplos 1 e 2 são crescimentos exponenciais, de bases e , respectivamente. Note que temos crescimento pois e .
Exemplo 3
Imagine que, a massa de isótopos radioativos em uma certa amostra de material reduza em 20% a cada ano. Assim, a cada passagem de um ano, a massa de isótopos radioativos será 20% menor que no ano anterior, isto é,
Com isso, vemos que, a cada intervalo de um ano, a massa radioativa é multiplicada por . Sendo a massa inicial, isto é, , teremos então
O fenômeno do exemplo 3 é um decaimento exponencial, de base . Note que temos um decaimento pois a base é menor do que 1.
Definição 1
Uma função será exponencial se sua expressão for da forma
para algum número real .
Já vimos que, se , temos
Porém, ainda precisamos definir claramente o que representa quando é irracional, isto é, não pode ser escrito na forma , com e inteiros, .
Lembre-se, porém, que um número irracional pode ser escrito na forma decimal (infinita) como
onde é a parte inteira e , , ... são os dígitos da parte decimal, isto é, cada é um algarismo de 0 a 9. Desta forma, podemos aproximar por
e a aproximação será tão boa quanto quisermos, bastando acrescentar mais dígitos. Assim, podemos dizer que quando .
É razoável supormos que a função exponencial seja contínua, uma vez que a estamos utilizando para modelar fenômenos naturais. Assim, como estamos supondo contínua e como temos , temos
Como , isto é, os 's se aproximam de , logo os valores , , ... se aproximam de .
Em outras palavras, à medida em que aproximamos o número irracional por , , , ..., estaremos obtendo aproximações , , , ..., cada vez melhores de .
Na expressão da função exponencial, , a base, , é um número real positivo fixo, o que varia é o expoente . É diferente, portanto, de uma função potência, com expressão na forma , em que o expoente é fixo e a base é quem varia.
O gráfico da função exponencial é como um dos gráficos abaixo, dependendo do valor de .
Observe que, quando a função é constante e igual a 1, pois para todo . Para toda base , teremos .
Outra observação importante é que a função exponencial , , é sempre positiva, isto é, para todo .
E qual é a relação da função exponencial com a derivação?
Voltando à discussão do começo desta seção, se chamarmos de uma grandeza que varia em função do tempo , muitos fenômenos naturais (não todos, mas muitos) obedecem à Lei do Crescimento ou Decaimento Natural, na qual
ou, escrita com outra notação
Veremos na próxima seção que as funções exponenciais são soluções para esta equação.
Em fenômenos que obedecem à Lei do Crescimento ou Decaimento Natural, a tendência de variação da grandeza é proporcional ao tamanho da grandeza. É bem plausível acreditarmos que um crescimento populacional (que já vimos ser modelado por uma função exponencial multiplicada por uma constante) obedeça a uma lei como esta, pelo menos enquanto não houver qualquer limitação de recursos para a população. Quanto mais indivíduos houver, tanto maior será o crescimento populacional esperado.
A Derivada da Função Exponencial
Já vimos que uma função será exponencial se sua expressão for da forma
para algum número real .
Esta função é contínua em todo o domínio . Veremos agora que é diferenciável e calcularemos a derivada. Sabemos que a derivada de uma função em é definida por um limite que pode ser escrito como:
Se tentarmos calcular a derivada da função exponencial a partir do limite acima, teremos:
Por outro lado, a derivada em , será dada por
Comparando esta expressão de com a obtida em 2, vemos que
ou seja, a derivada da função exponencial é, para todo valor de , igual à própria função , multiplicada pela constante . Com isso, mostramos o que foi afirmado na introdução desta seção, que a derivada da exponencial é proporcional ao valor da função.
Isto nos leva a uma pergunta: será que existe algum valor para a base tal que seja igual a 1? A exponencial cresce tão mais rápido quanto maior é a base, o que reflete no valor da derivada em . Observando os gráficos de e abaixo, percebemos que a reta , de inclinação 1, fica entre estes dois gráficos em .
Assim, é fácil acreditarmos que e . Parece razoável, embora ainda careça de maior justificativa, acreditarmos que existe um número entre 2 e 3, que chamaremos de (chamado de número de Euler) tal que, se , temos .
Com este número especial, definindo , teremos
Embora você possa estar pouco familiarizado com este , acho que já podemos concordar que ele é um grande amigo do estudante de Cálculo. Exceto talvez pela derivada de uma constante (que é 0), a derivada da função exponencial de base é a mais amigável que você pode encontrar na disciplina.
Voltaremos a falar um pouco mais sobre a misteriosa existência do número na seção ???, mas, por curiosidade, este número é dado por . Note que é um número irracional, cuja expressão decimal é infinita e não segue qualquer padrão de repetição.
A exponencial de base é tão útil e especial que há uma notação específica para ela. É muito comum denotar a função , . Assim, .
Exemplo 4
Calcular , sendo , onde é diferenciável.
Aplicando a Regra da Cadeia, temos
Exemplo 6
Calcular se .
Derivando cada termo usando a regra da cadeia obtemos
Exemplo 7
Calcular onde é implicitamente definida pela equação .
Nesse caso utilizamos derivação implícita e a regra do produto:
Resolvendo para obtemos
Relembrando a seção anterior, uma grandeza obedecerá a Lei do Crescimento ou Decaimento Natural se
Esta equação será satisfeita quando , com constante, pois
Assim, é naturalmente uma expressão para fenômenos de crescimento ou decaimento exponencial. Em Cálculo 2A, você verá que é, na realidade, a única forma de modelar tais fenômenos, isto é, a única solução para a equação diferencial .
Vamos agora tentar encontrar uma expressão para a derivada da função exponencial com uma base diferente de . Para isso, precisamos introduzir agora a função logarítmica natural, ou função logarítmica de base e. Vamos relembrar um pouquinho dos logaritmos.
Definição 2
Seja , . Diremos que se . Isto é, é o logaritmo de x na base a se é o expoente que precisamos dar ao número para que a potência resulte em .
Exemplo 8
Alguns exemplos:
Exemplo 9
Uma população de bactérias cresce a uma taxa proporcional à população presente. Sabendo-se que após uma hora a população é 2 vezes a população inicial, determine a população como função do tempo e o tempo necessário para que a população triplique.
Já vimos que a população é dada por , pois o valor dobra a cada passagem de uma hora. Precisamos calcular o tempo necessário para que a população triplique, isto é . Então , logo e, com isso, . Relembrando as propriedades de mudança de base, podemos ainda escrever . Uma calculadora nos dará 1h e 35 min.
Note que só podemos calcular quando , pois é o mesmo que e, como , teremos necessariamente .
Um fato importante é que, para qualquer , , e para todo ,
Consegue entender por quê? Ora, é o expoente que precisamos dar ao para que ele se torne , então, dando este expoente ao ... ele se tornará ! A identidade acima será muito utilizada em vários momentos deste curso.
Como é um número positivo diferente de 1, podemos naturalmente pensar no com base , que denotaremos ou ainda . Com esta notação, por exemplo, , pois ; , pois , , pois ; e assim por diante. Outro fato importante é que, pela
identidade 3,
De maneira ainda mais geral, elevado ao de qualquer coisa é a própria qualquer coisa. Por exemplo, se esta qualquer coisa for uma função,
O logaritmo em base é tão especial que, além da notação , há muitos autores que o representam simplesmente por , especialmente em textos da área de Análise Matemática. Como também é comum se utilizar para a exponencial em base 10, especialmente em textos mais voltados a aplicações, utilizaremos apenas ou , sendo este último apenas para fins didáticos, quando quisermos relembrar que é um de base .
Já estamos em condição de tentar obter uma derivada para uma função exponencial , com qualquer . Pela igualdade 4, temos
Assim,
Podemos então derivar utilizando a Regra da Cadeia.
Note que, nas contas acima, utilizamos que e que , pois é uma constante. Assim,
Exemplo 10
Vamos derivar .
Usando que , temos . Observe que é uma constante e que a derivada de é feita utilizando a regra da potência, pois o expoente é constante. Logo
A Derivada da Função Logarítmica
Na seção anterior, dados , e , definimos que se , ou seja, o logaritmo de x na base a é o expoente que precisamos dar ao número para que a potência resulte em . Se definirmos a função exponencial de base por , temos então que se e somente se . Assim, a função
é a função inversa de
isto é, .
Note ainda que
ou seja, o que a exponencial faz, o desfaz, e vice-versa.
O caso mais interessante é quando a base é igual a . Neste caso, temos a exponencial e a função logarítmica . Pelo que vimos acima, e (uma função é a inversa da outra).
Com isso, podemos aplicar o Teorema da Função Inversa, que vimos nas seções anteriores. Se , este Teorema nos garante que
logo,
Escrevendo com , que é o mais comum, temos que
Vamos agora obter a derivada da função logarítmica com uma base qualquer. Podemos fazer isto de duas formas. A primeira delas é repetir o argumento acima, isto é, se , denotando , temos que e, portanto, pelo TFI,
logo
Outra forma de obtermos o mesmo resultado é através da mudança de base no logaritmo:
logo
Exemplo 11
Seja e vamos calcular .
Usando que e a regra da cadeia obtemos
Usando a regra do produto e logo
Exemplo 12
Derivar a função definida por , com .
Embora esta função tenha uma expressão simples, ela não se encaixa nas regras elementares de derivação. Ela não é uma potência, por exemplo, pois o expoente não é constante. Tampouco é uma exponencial, pois a base não é constante.
Podemos escrever
logo
Derivando, temos
Como , temos
Derivação Logarítmica
Quando queremos derivar funções muito complexas, envolvendo produtos, quocientes, potências e exponenciais, as regras de derivação podem se tornar muito difíceis de aplicar. Veremos agora um processo um pouco mais simples, que chamaremos de derivação logarítmica.
Exemplo 13
Derivar a função dada por , com .
Já pensou ter que aplicar todas as regras de derivação necessárias? Regra do produto, do quociente, da cadeia, derivada de potência, de exponencial... é trabalho para três dias!
Quando , podemos, por outro lado, escrever
Agora, com as propriedades do logaritmo, podemos simplificar o lado direito, obtendo
logo
e agora derivar em relação a , obtendo
logo
ou ainda
Assim,
Exemplo 14
Derivar a função definida por , com .
Já derivamos esta função na seção anterior, mas vamos derivar novamente, desta vez utilizando derivação logarítmica.
Aplicando aos dois lados,
logo
Derivando, temos
logo
portanto
Com isso
Nestes exemplos, seguimos os seguintes passos:
- Aplicamos o aos dois lados da expressão de .
- Utilizamos as propriedades do logaritmo para simplificar a expressão obtida do lado direito (se não conseguirmos simplificar, não fará muito sentido utilizarmos este método)
- Derivamos os dois lados (no lado esquerdo, teremos )
- Isolamos passando o multiplicando para o lado direito.
Exemplo 15
Derivar a função , com .
Vamos proceder por derivação logarítmica. Temos
Derivando dos dois lados,
Um pouco mais sobre o número
Esta seção pode ser lida como uma curiosidade apenas, ou mesmo ser omitida em uma primeira leitura.
Sabemos que a derivada de é , assim,
(em (*) utilizamos que , em (**) utilizamos ).
Como a função exponencial é contínua em , e como temos que
Assim,
Fazendo , quando , teremos que . Assim,
Como já foi visto nas seções anteriores, outra forma interessante de explorar o número é aproximar a função exponencial por Polinômios de Taylor em torno do ponto . O Polinômio de Taylor de ordem em , é dado por
Sabemos que , logo
ou seja, as derivadas de todas as ordens da exponencial de base são iguais à própria exponencial. Assim,
Com isso, o Polinômio de Taylor em torno de pode ser escrito como
Tomando , temos
Como, por definição, e , temos
Já vimos que o erro na aproximação do Polinômio de Taylor acima, isto é, a diferença entre e é dado por , para algum . Como , temos que o erro é menor que . Ou seja, se escolhermos um valor muito grande para , a soma
será uma excelente aproximação para . Se quisermos uma aproximação ainda melhor, tão boa quanto precisarmos, basta tomar um ainda maior. Isto significa que pode ser dado pela soma de infinitas parcelas
Se voltarmos ao Polinômio de Taylor , vemos ainda que pode ser dado por
Somas infinitas podem parecer estranho, mas você já as viu quando estudou Progressões Geométricas, no Ensino Médio. Aqui, temos algo semelhante, uma soma cujas parcelas vão muito rapidamente para 0, tão rápido que fazem a soma convergir, embora não seja uma progressão geométrica.
Há um fato bem interessante relacionado a esta expressão de como soma infinita. Vamos assumir que podemos derivar a soma infinita termo a termo, como podemos fazer com uma soma de finitas funções. Não é imediato que a possamos fazer isso, na verdade, precisamos de muito arroz com feijão matemático para garantir que é possível, e mesmo assim, apenas sob certas hipóteses. Mas, ok, supondo que possamos derivar, teremos
mostrando que esta expressão se comporta muito bem com relação à derivada, nos levando ao esperado .